Caspar David Friedrich: o renascimento artístico do mestre romântico

Ignorado pela arte contemporânea ao morrer em 1840, Caspar David Friedrich ressurge esplendorosamente no cenário cultural às vésperas de seu 250º aniversário, com exposições previstas que prometem elevar ainda mais sua estima.

Atualizado 01/02/2024 às 09:39 por Juliana Alves Naziazeno

Quando Caspar David Friedrich encerrou sua jornada neste mundo, seu nome ecoava somente nos corredores do esquecimento artístico. No entanto, a proximidade do seu 250º aniversário de nascimento está prestes a mudar esse cenário de maneira monumental. A arte deste pintor, que já foi reverenciada por ninguém menos que Adolf Hitler, agora está recebendo um olhar renovado e cheio de admiração na esfera artística contemporânea.

Nota

Embora Adolf Hitler tenha expressado admiração pela obra de Caspar David Friedrich, é crucial distinguir essa apreciação pessoal das intenções e valores do próprio artista. Friedrich, cujas pinturas exploram profundamente a relação entre homem e natureza, nunca buscou ou endossou associações ideológicas. A admiração de figuras históricas por sua arte não deve ofuscar o legado de Friedrich, cuja visão transcende contextos históricos específicos. Ao celebrarmos seu 250º aniversário de nascimento, enfocamos a universalidade e a beleza de sua obra, independentemente de interpretações externas.

Com três grandes exposições programadas na Alemanha para este ano, o movimento de reavaliação de Friedrich está ganhando força. A cidade de Hamburgo saiu na frente com uma mostra na Kunsthalle, inaugurada em dezembro, que destaca sua visão revolucionária da relação entre homem e natureza, com destaque para sua obra mais célebre, “O viajante sobre o mar de névoa”, datada de aproximadamente 1817. No dia 19 de abril, a Alte Nationalgalerie de Berlim dará continuidade a esse ciclo de reconhecimento, seguida por exposições em Dresden nas instituições Albertinum e Kupferstich-Kabinett a partir de agosto. Além disso, eventos estão previstos em cidades menores, incluindo Weimar e Greifswald, esta última o berço do pintor no extremo nordeste alemão.

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Centro de sucesso e influência real

Na época em que Friedrich esteve entre nós, Berlim representou um papel crucial para o seu sucesso, mais até do que Dresden, cidade onde o artista viveu por quatro décadas. Birgit Verwiebe, especialista em Friedrich e curadora da exposição berlinense, salienta a importância da capital alemã na trajetória do pintor. Ele foi especialmente apreciado por figuras ilustres como o poeta romântico Clemens Brentano, o dramaturgo Heinrich von Kleist e, mais significativamente, pelo príncipe herdeiro que ascendeu ao trono como Frederico Guilherme IV, conhecido como “o romântico no trono”.

Este último, influenciado por sua paixão pelas paisagens de Friedrich, convenceu seu pai, Frederico Guilherme III, a adquirir várias obras marcantes no início do século XIX. Dentre elas, “O monge à beira-mar” e “A abadia no carvalhal” se destacam por suas representações panorâmicas e simbolismos enraizados na natureza.

As aquisições reais não apenas enriqueceram a coleção berlinense, como também abriram caminho para que Friedrich conquistasse apreciadores na Rússia. A irmã do príncipe herdeiro, Charlotte, casou-se com o czar Nicolau I, levando o entusiasmo pelas obras do artista para a corte Russa. Até hoje, nove pinturas de Friedrich residem no famoso museu Hermitage em São Petersburgo.

Infelizmente, os recentes desentendimentos políticos e a invasão da Ucrânia encerraram as negociações de empréstimo de obras entre os museus alemães e a Rússia, uma complexidade diplomática que reflete os tempos conturbados que vivemos.

Redescoberta e ascensão

Após um período de obscuridade no início do século XX, uma exposição em 1906 na Nationalgalerie de Berlim apresentou aos olhos do mundo 93 trabalhos de Friedrich, dando início a um renascimento lento, mas constante, que ainda ganha impulso. Posteriormente, a associação de sua imagem com o regime nazista durante a Segunda Guerra Mundial trouxe um estigma que levou décadas para ser superado.

Apenas na década de 70, com uma grande exposição na Tate de Londres e uma mostra comemorativa na Hamburger Kunsthalle, o artista voltou a ganhar destaque internacional. Esse interesse crescente também se refletiu no mercado de arte, com desenhos de Friedrich ainda circulando entre colecionadores privados e um esboço raro arrematado recentemente por 1,8 milhão de euros em um leilão na Villa Grisebach.

Influência nos tempos atuais

O legado de Friedrich continua a inspirar artistas contemporâneos, como Gerhard Richter, que foi motivado pela pintura “O mar de gelo” de 1823-24 a visitar a Groenlândia em 1972. A exposição em Hamburgo faz questão de explorar esse impacto através das obras de artistas atuais como Julian Charrière, Olafur Eliasson, Ulrike Rosenbach e Kehinde Wiley.

A curadora Verwiebe observa que a fama internacional de Friedrich ainda está em ascensão. Exposições recentes, como a do Kunst Museum em Winterthur, atraíram um público tão numeroso que o museu precisou alertar sobre tempo de espera. O encanto de sua arte, que parece dialogar pessoalmente com cada espectador, é um dos segredos de tal sucesso.

Com os eventos alemães deste ano, a expectativa é que a plateia de admiradores de Friedrich se expanda ainda mais, antecipando a grande exibição solo nos Estados Unidos em 2025 no Metropolitan Museum of Art em Nova York, intitulada “Caspar David Friedrich: A Alma da Natureza”. No entanto, essa crescente valorização pode tornar futuras exposições mais raras, à medida que museus relutam em ceder suas preciosidades e os custos de seguro se tornam proibitivos para instituições menores.

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